Monumentos escravocratas em ruínas

enlaces entre informação, memória e estudos decoloniais

  • Igor Oliveira da Silva Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
  • Gracy Kelli Martins Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
Palavras-chave: Colonialismo, Contramonumento, Memória nacional, Novos Movimentos Sociais, Representação social

Resumo

O objetivo central do estudo é refletir, à luz dos estudos decoloniais, sobre como as reivindicações étnico-raciais, geradas no âmbito dos Novos Movimentos Sociais, impactam a ressignificação da memória nacional. Trata-se de um artigo para cujo desenvolvimento foi adotada uma abordagem sociocultural da informação, que enfoca os protestos globais ocasionados a partir do ano de 2020 acerca dos monumentos públicos contruidos para homenagear personagens ligados ao tráfico escravista, ao colonialismo e às diversas expressões de racismo. Como procedimento metodológico, procedeu-se a uma pesquisa exploratória por meio de uma revisão bibliográfica. Apresenta algumas discussões acerca da (des) colonialidade do poder e do saber, para dar visibilidade aos saberes produzidos pelos grupos que não integraram a visão eurocêntrica do conhecimento; mostra como a Ciência da Informação pode contribuir para representar a produção intelectual do conhecimento construído socialmente por um grupo de sujeitos subalternizados pela episteme eurocêntrica; analisa como os Novos Movimentos Sociais exercem o contrapoder e se constroem por meio de um processo de comunicação autônoma e livre do controle dos que detêm o poder institucional para combaterem as amarras coloniais; mostra como surgem as discussões sobre o conceito de documento/monumento e os relaciona com o movimento denominado de contramonumento e a reivindicação discursiva que dá voz às vozes silenciadas e esquecidas; apresenta o contexto histórico e social de personagens como Cristóvão Colombo (1451-1506), Thomas Jefferson (1743 – 1826) e George Washington (1732 – 1799), cujas estátuas foram retiradas/apedrejadas em decorrência das disputas sociais permeadas de questões políticas e ideológicas antagônicas; descreve como o contramonumento atinge o cenário brasileiro, a partir do monumento do bandeirante paulista Manuel Borba Gato (1649 – 1718), cujo monumento foi queimado por movimentos que reivindicavam o sentido heroico atribuído a um personagem ligado à caça e à escravização de índios e negros. O artigo também analisa as iniciativas de reparação histórica. Para isso, aborda o recente debate sobre o Projeto de Lei Federal 5296/2020, o Projeto de Lei Municipal 47/2021 e a atuação dos museus na guarda dos monumentos históricos polêmicos que devem ser contextualizados mediante a educação patrimonial. Conclui que os monumentos públicos são objetos informativos que representam determinados eventos históricos que despertam a memória dos grupos que sofreram alguma consequência dos atos praticados por seus personagens.

Biografia do Autor

Gracy Kelli Martins, Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) Marília/SP. Mestra em Ciência da Informação pela Universidade Federal da Paraíba - UFPB, Graduada em Biblioteconomia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Atua nas áreas de Organização e Representação da Informação/ Conhecimento; Representação e Mediação da Informação; Estudos de gênero; Fundamentos teóricos e memória na Biblioteconomia e Ciência da Informação.

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Publicado
2024-01-09
Como Citar
SILVA, I. O. DA; MARTINS, G. K. Monumentos escravocratas em ruínas: enlaces entre informação, memória e estudos decoloniais. Folha de Rosto, v. 9, n. 2, p. 7-26, 9 jan. 2024.
Seção
Dossiê: Estudos críticos em Mediação, Organização e Representação da Informação